Alucinações de dois comerciantes

Isto do comércio a retalho nunca se pode ter certezas e o melhor é o caro cliente franzir o sobrolho assim que nos veja atrás do balcão.

Nós que recusamos todas as formas do marketing indirecto, nós que escarnecemos das leis do comércio, que injuriámos o livro de reclamações até ao terceiro tomo, que nos esquivamos aos guichets burocráticos, que não deixamos o freguês sem troco, que atirámos a primeira e a última pedra, nós que estamos aqui para não ter de aturar mais ninguém, o Papa, o presidente do Infesta, o chefe de repartições, o gerente e o padreco, os mass media, o chulo, as valdovinas, íamos agora perder tempo a organizar uma noite de gala, quando a Gala já foi galada pelo Dalí enquanto o diabo esfregava o olho e os bigodes estratosféricos do Salvador, e, caro freguês, salvarmo-nos de quê? Nós que para o ano prometemos erradicar o caruncho das cadeiras, nós que para o ano vamos adquirir – se os critérios de Co-invaginência permitirem e a ministra autorizar – outro aquecedor made in china para aplacar a friagem, nós que ao que tudo indica vamos pôr uns atoalhados novos, quiçá um sistema de wire-less assim que as teias de aranha sejam varridas dos frisos, que perdemos a cabeça e arranjámos um rádio a pilhas, pois o ano passado dando sinais de uma alienação à prova da Situação, esquecemo-nos, melhor, nem sequer nos ocorreu, que deveríamos estar atentos ao final Countdown, mas enquanto não trazemos os Europe – it’s the finest shut down!! – já frisámos os cabelos dos pés, e preparámos um Kit-míssil-calçado cosido à mão ali no vale do Ave, onde se mantêm algumas tradições árabes intactas apesar de não terem em todos os tempos possíveis e imagináveis a tal biblioteca de Bagdade que tinha mais livros na Idade Média que todas as bibliotecas juntas da nossa Europe tão civilizada e cujos altos desígnios mandaram escangalhar, pois dizíamos, a troco de uns tustos oferecemos o tal Kit-míssil-calçado para bombardear com chulé artesanal o ano velho e, vá que não vá, uma tacinha de champagne já que no ano passado sobraram três garrafinhas, e juntos cantaremos louvores ao novo ano pois continuaremos a chafurdar na mesma pocilga, e nós que temos com isso, e vem virá vir-se-à o famous grouse e o capão de Freamunde, venham, venham todos e todas que se nós pudermos ficamos em casa com os pés-de-molho, tanto calo e frieiras de tanto trabalhar um ano inteiro, por que esta vida de feirante e farsante não é para qualquer um, e venha a música da ciganada, a euforia balcânica, e se no ano passado prometemos a depressão e a loucura, vamos então dar lugar aos casamentos e funerais, a bem dizer, os vadios não passam de angelicais meninos de aliança e sinistros cangalheiros. Que o Gato Vadio se aguente com o pernil ao alto antes que a dona Chica lhe arrume o pau…admiram-se?

Passagem de Ano no Gato Vadio

Música cigana e balcânica.

Taxa solidária vadia: 4€ (inclui champagne a rodos…)…

A partir das 21h30

Rua do rosário 281, Porto